Educar e evangelizar

«A nossa missão participa na missão da Igreja, que realiza o plano salvífico de Deus, o advento do seu Reino, levando aos homens a mensagem do Evangelho, intimamente unida ao desenvolvimento da ordem temporal. Educamos e evangelizamos segundo um projeto de promoção integral do homem, orientado para Cristo, homem perfeito. Fiéis às intenções do nosso Fundador, visamos formar “honestos cidadãos e bons cristãos”» (Const. 31)

«O sistema apoia-se todo na razão, na religião e na bondade» (Dom Bosco, O Sistema Preventivo na Educação da Juventude).

A vida em plenitude e a felicidade dos seres humanos é o sentido último do plano de Deus. O Evangelho de Cristo tem grande confiança no humano. É preciso dar atenção à realidade única de cada pessoa e à disponibilidade para acolher a vocação e o destino em Cristo, “homem perfeito”. O Evangelho propõe a bela notícia (a pessoa de Jesus), que a todos convida a participar na filiação em Cristo, fundamento da liberdade e da dignidade de toda a pessoa. Dom Bosco educa e evangeliza pondo em ação um projeto de promoção integral: a educação como desenvolvimento da pessoa, como conjunto de mediações necessárias ao serviço das pessoas; a evangelização inspira e ilumina a plenitude da vida plena oferecida em Jesus, respeitando a condição evolutiva do sujeito. Por fim, a escolha do campo apostólico: os jovens, sobretudo os mais pobres, e os ambientes populares, pelos quais e nos quais se humaniza e se evangeliza a cultura.

1.- A vida em plenitude e a felicidade do ser humano

Construir-se como pessoa é tarefa quotidiana, ligada à alegria e ao compromisso de existir. Às vezes, um compromisso particularmente empenhativo. Tem-se a sensação de precisar de inventar por si (e sozinho) um percurso inédito, que nunca é linear, mas marcado por altos e baixos, por momentos de satisfação e momentos de frustração, de esperanças e desilusões: um construir-se que frequentemente permanece como trama de situações e experiências sem grandes referências ideais ou grandes preocupações de coerência e unidade.

Nesse sentido, o contexto atual provoca uma nova insatisfação, não temporária, mas permanente. À mudança incessante que carateriza a sociedade e a cultura, une-se a fragilidade das instituições que acompanham os jovens nesta situação. Tornam-se urgentes e importantes a atitude responsável do educador salesiano e a solidez da sua proposta.

A reflexão de Paulo VI, indicando que a ruptura entre fé e cultura é um drama do nosso tempo, não perde a atualidade (cf. Evangelii Nuntiandi 20). A cultura atual, não homogénea, influi sobre os jovens através da sua complexidade e fragmentação; com seus vários estímulos e suas virtualidades leva a uma compreensão consumista também do que é afetivo e deixa os jovens na selva dos desejos, diante da dura realidade de uma crise económica e existencial.

Ao lado desta dura realidade, encontram-se no coração das pessoas capacidades e possibilidades incrivelmente preciosas que levam a empreendimentos extraordinaria-mente grandes; enfim, homens e mulheres, na própria singularidade, refletem sobre si mesmos, interrogam-se a respeito do sentido da vida (de onde venho, para onde vou, como desejo caminhar, com quem quero caminhar), conscientemente ou nos factos, estabelecem uma orientação precisa à própria vida. No horizonte último do humano está a vida em plenitude, no jovem e no educador, que envolve a ambos.

«Cremos que Deus está à nossa espera nos jovens para nos oferecer a graça do encontro com Ele e para nos dispor a servi-l’O neles, reconhecendo-lhes a dignidade e educando-os para a plenitude da vida» (CG23, n. 95).

Na interpretação da vivência das pessoas, observamos a necessidade de serem amadas, o sentido da gratuidade, o prazer de se sentirem valorizadas e importantes pelo que são e não em vista dos objetivos ou resultados alcançados: percebemos que a falsa orientação da vida quotidiana é uma questão de sentido, uma questão de projeto de vida. Por isso, é urgente que, como educadores, identifiquemos aquilo pelo qual vale a pena gastar a própria existência e entregar-se a si mesmo em favor dos outros. É urgente ver nos jovens não recipientes a encher, mas pessoas a acompanhar. Ajudamo-los a serem eles mesmos, a descobrirem a beleza da própria vocação.

Como cristãos, lemos nesta lógica o projeto de vida sob o sinal da vocação, chamamento de Deus que suscita, sustenta e reforça a liberdade do jovem, tornando-a capaz de corresponder com liberdade e alegria à própria identidade e missão.

A vivência do Evangelho em plenitude não só abre à dignidade do humano, mas também liberta e sustenta a sua capacidade de resposta responsável e madura a Deus. A vida humana coloca-se sob o sinal da vocação, que requer grande abertura de espírito, responsabilidade no acolhimento de um compromisso fiel: “responsabilidade” significa literalmente assumir a beleza do “responder”.

Nesta dinâmica, o jovem é levado a avaliar-se, a sair de si, a deixar-se questionar por experiências novas, em vista de encontros que o levem mais longe, onde se assumirá mais profundamente a si mesmo. É neste espaço que se coloca também a proposta da fé e a resposta do projeto de vida. O jovem, objeto do chamamento de Deus, é protagonista a escutá-lo e no responder-lhe: é o seu “responsável”.

Ter conhecimento da “vocação” é o modo de entender verdadeiramente a própria vida e a própria liberdade. Só quando a liberdade assume esta tarefa, é que ela vai além do eu pessoal, entra na esfera do amor e aceita construir o bem também para os outros. Numa palavra: vocação é amar, entregar-se, fazer de si mesmo um dom que testemunhe uma nova cultura com inteligência amorosa. A vocação é uma resposta de amor. Todo o projeto de vida que nasça de uma vocação é um dom a oferecer, que transcende o próprio eu.

2.- Orientado para Cristo, homem perfeito

2.1.- Integrar o amor pela vida e o encontro com Jesus Cristo

A fé leva-nos a descobrir que o projeto de vida e a transcendência da pessoa referem-se a Cristo na sua condição histórica de único verdadeiro “Homem novo”. Nós, salesianos, formamos uma comunidade de batizados e apresentamo-nos na Igreja e no mundo com uma missão, uma vocação e uma razão de ser particular: propor a todos a vivência da existência humana como Jesus a viveu, e que o seguimento de Cristo pode preencher a vida. Perguntemo-nos: como propor o Evangelho de Jesus de modo que ele resulte desafiante para o amadurecimento na vida? Como podem os desejos do homem concorrer com Jesus Cristo?

A pessoa de Jesus, perito em humanidade, interage com todos os desejos humanos com a sua mensagem; ele mostra grande confiança no humano, no qual encontra os sinais do bem e da presença de Deus. Jesus levou a sério as necessidades do homem, o desejo de viver bem com o seu próprio corpo, com a própria mente, no vasto mundo das relações, nas experiências afetivas. Ele conhece o que há no coração do homem, o seu desejo de sentir-se reconciliado com o próprio ser profundo, frequentemente fragmentado, sem que tudo isso seja fruto de merecimento, mas apenas por bondade e ternura. E, no fundo, traz uma simpatia radical, no sentido etimológico do termo, evocado pela Gaudium et Spes:

«As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração» (Gaudium et Spes 1).

E pode fazê-lo porque a sua proposta libertadora é cheia de humanidade, feita de gestos e palavras de acolhimento, de reciprocidade, de escuta. Isto implica, no plano da antropologia cristã, a consciência da correlação íntima entre a riqueza da humanidade de cada pessoa e a experiência humana de Jesus. Ela tem o seu fundamento na Encarnação de Cristo: a vida humana, mesmo sob as aparências mais indigentes e mesquinhas, torna-se digna de ser, à imitação de Cristo, lugar onde Deus se faz presente, e é chamada a desenvolver-se até a comunhão plena com Deus mediante o dom de si. Pela Encarnação, Jesus de Nazaré é o único caminho acessível para conhecer o mistério de Deus e o mistério do homem. O mundo de Deus e o mundo do homem não são distantes e incomunicáveis. Deus e o homem estão em pleno diálogo a partir de Jesus Cristo, o intérprete mais profundo da verdade do homem.

«Sem Deus, o homem não sabe para onde ir e não consegue sequer compreender quem é» (Caritas in Veritate 78).

A missão de Jesus manifestou-se num contexto de encarnação-inculturação. A Encarnação, como expressão máxima de inculturação, não é um facto secundário, mas o caminho escolhido por Deus para se automanifestar: a revelação foi transmitida mediante a Encarnação. A missão da Igreja, guiada e suscitada pela missão do Espírito Santo, foi realizada e realiza-se sempre em categorias espácio-temporais, de profunda inculturação na vida dos povos. A Nova Evangelização realiza-se na inculturação da fé. Isto implica a escolha de três estratégias: uma nova evangelização através da catequese e da liturgia (evangelizar catequizando); uma nova evangelização atenta à promoção integral do povo, a partir dos pobres, pelos pobres, ao serviço da vida e da família (evangelizar promovendo); uma nova evangelização empenhada em penetrar nos ambientes da cultura urbana e não urbana (evangelizar inculturando). Na época da Nova Evangelização, a nova pastoral (cf. P. Pascual Chávez, ACG 407, “A Pastoral Juvenil Salesiana”) deve ser aquela que ao mesmo tempo catequiza, promove e incultura. Se a Nova Evangelização não se traduzisse em promoção humana e inculturação, não seria autêntica e não faria amadurecer a energia da fé na história.

Sendo o Mistério de Cristo, na sua Encarnação-Morte-Ressurreição, a revelação plena e completa da humanidade e da enorme grandeza de cada pessoa, a Igreja pode ser intérprete do humano, pode mostrar-se perita em humanidade, pode lançar-se livremente, sem temor, no terreno do humano: uma antropologia cristã, em que a centralidade da pessoa, não concorrendo certamente com o primado de Deus, é compreendida no horizonte da sua iniciativa. A ciência de viver imerso no dom da salvação de Deus e de ser, em Jesus Cristo, «criaturas novas» (Rm8) é uma experiência que unifica a existência.

A confiança cristã na vida e no homem, na sua razão e na sua capacidade de amar, não é fruto de um otimismo ingénuo, mas provém da «esperança confiável» (Spe Salvi 1) que nos é dada com a filiação em Cristo; ela serve de fundamento à dignidade, à liberdade e à capacidade de amar e de ser amado e permite à pessoa viver de modo autenticamente humano, conforme a sua natureza e a sua vocação. Cristo encontra o espaço mais íntimo da humanidade. Revelando o mistério do Pai e do seu amor, «Cristo revela plenamente o homem ao homem» (Gaudium et Spes 22) e dá-lhe a conhecer a sua altíssima vocação.

A pastoral juvenil habilita os jovens a descobrirem a profundidade da sua própria experiência até perceberem o seu apelo religioso, a plena comunhão com Jesus Cristo. Gradualmente, Jesus Cristo torna-se uma pessoa central em relação à qual se organiza a vida: atitudes, opções, ações, comportamentos. Hoje também encontramos vários modelos pedagógicos, permeados de valores positivos, mas que na sua antropologia prescindem de qualquer referência a Jesus Cristo e, portanto, da visão integral do homem que encaminha a vida para a meta da salvação, como vida nova, para o pleno amadurecimento da pessoa.

A ação salesiana, em qualquer ambiente que se desenvolva, compreende sempre no seu âmago o anúncio de Cristo e a solicitude pela salvação dos jovens; a «predileção pelos jovens dá sentido a toda a nossa vida» (Const. 14). Em qualquer iniciativa educativo-pastoral, esta solicitude constitui sempre a intenção e o desejo principal. Tudo deve ser explicitado na medida em que os sujeitos se tornam capazes disso. É este o “projeto apostólico” de Dom Bosco: «ser, com estilo salesiano, sinais e portadores do amor de Deus aos jovens, especialmente aos mais pobres» (Const. 2).

Desejamos que escutem Deus Pai, que conheçam Jesus Cristo. Estamos convencidos de que a proposta do Evangelho traz energias insuspeitadas para a construção da personalidade e o desenvolvimento integral que todo o jovem merece. Trata-se de um processo pedagógico que toma em consideração todos os dinamismos humanos, e favorece nos jovens as condições que tornam cada resposta um ato de liberdade. O sentido do realismo, a paciência da gradualidade são atitudes que respeitam a situação pessoal de cada jovem, do mais frágil ao mais forte, do mais afastado da fé e da experiência eclesial ao mais próximo delas.

2.2.- A originalidade e a audácia da arte de educar em Dom Bosco

A pedagogia de Dom Bosco assume com insistência explícita a autêntica finalidade religiosa da vida num processo educativo positivamente orientado para Cristo e iluminado pela sua mensagem: a integração de fé e vida, nutrida pela sua força. É fundamental reconhecer que a preocupação pastoral de Dom Bosco se situa dentro do processo de humanização que promove o crescimento integral da pessoa dos jovens: a descoberta do projeto de vida e o esforço de transformação do mundo segundo o projeto de Deus sobre cada um deles. A originalidade e audácia da proposta da “santidade juvenil” é intrínseca à arte de educar de Dom Bosco: santidade que não frustra as profundas aspirações do espírito juvenil (necessidade de vida, de expansão, de alegria, de liberdade, de futuro, etc.); santidade que, de forma gradual e realista, os jovens experimentam como “vida de graça”, de amizade com Cristo, e realização dos próprios ideais mais autênticos: «Nós aqui fazemos consistir a santidade em estar sempre alegres» (São Domingos Sávio).

3.- Evangelizar e educar segundo um projeto de promoção integral

3.1.- O horizonte de compreensão da evangelização

«Evangelizar não é só ensinar uma doutrina, mas anunciar Jesus Cristo com palavras e ações, isto é, fazer-se instrumento da sua presença e ação no mundo» (Nota doutrinal sobre alguns aspetos da evangelização 2 ).

A evangelização torna-se veículo e expressão do anúncio claro e inequívoco do Senhor Jesus; ela comunica a sua mensagem, a sua proposta de vida e a salvação realizada por Deus, para todos, com o poder do Espírito. A reflexão eclesial sobre a evangelização convoca todo o crente para o compromisso evangelizador que torna acessível a riqueza, a profundidade, a organicidade e a múltipla articulação da mensagem. Nesta ótica, a evangelização, em sentido mais amplo, é:

  • compromisso pela difusão do Reino e seus valores entre todos os homens e ação ao serviço do homem pela justiça social relativa aos direitos humanos, à reforma das estruturas injustas, à promoção social, à luta contra a pobreza e as estruturas que a provocam;
  • aproximação progressiva dos povos aos ideais e valores evangélicos: recusa da violência e da guerra, respeito por cada pessoa, desejo de liberdade, de justiça e de fraternidade, superação do racismo e dos nacionalismos, afirmação da dignidade e do valor da mulher;
  • intervenção operativa nos areópagos do mundo moderno e nas grandes áreas ou setores de sofrimento da humanidade: os exilados, os refugiados, os migrantes, as novas gerações, os povos emergentes, as minorias, as áreas de opressão, de miséria e de catástrofes, a promoção da mulher e da criança, a salvaguarda da criação, as relações internacionais e o mundo da comunicação social.

Evangelizar implica pluralidade de aspetos: presença, testemunho, pregação (anúncio explícito), apelo à conversão pessoal, formação da Igreja, catequese; mas também, inculturação, diálogo inter-religioso, educação, opção preferencial pelos pobres, transformação da sociedade. A sua complexidade e articulação foram enfatizadas pela Evangelii Nuntiandi (n. 17) e muito bem apresentadas na Redemptoris Missio (n. 41-60):

«A evangelização, por tudo o que dissemos, é uma diligência complexa, em que há variados elementos: renovação da humanidade, testemunho, anúncio explícito, adesão do coração, entrada na comunidade, aceitação dos sinais e iniciativas de apostolado. Estes elementos, na aparência, podem afigurar-se contrastantes. Na realidade, porém, são complementares e reciprocamente enriquecedores uns dos outros» (Evangelii Nuntiandi 24).

Esta visão ampla de evangelização valida a primeira tarefa da missão salesiana: a promoção integral das pessoas, segundo as urgências das múltiplas situações concretas (cf. Const. 31). Agir neste campo, inspirados pelo amor de Cristo e sob o sinal do seu Reino, é evangelização. A compreensão salesiana da evangelização é animada pela preocupação de integralidade, a que se segue a preocupação educativa pelo crescimento da pessoa na sua totalidade. A educação é o lugar humano em que apresentamos o Evangelho e no qual ele adquire uma fisionomia típica. A abordagem antropológica leva-nos a entender melhor como os espaços de ação do educador salesiano são felizmente marcados pelo humanismo integral e pela sua dimensão transcendente.

3.2.- A relação da ação educativa com a ação evangelizadora

A meta proposta pela Pastoral Juvenil Salesiana para todo jovem é a construção da própria personalidade, tendo Cristo como referência fundamental; referência que, tornando-se progressivamente explícita e interiorizada, o ajude a ver a história como Ele, a julgar a vida como Ele, a escolher e a amar como Ele, a esperar como Ele ensina, a viver n’Ele a comunhão com o Pai e o Espírito Santo (cf. CG23, n. 112-115). A verdadeira e real conversão missionária pede à Pastoral Juvenil Salesiana para descobrir e viver a profunda e inseparável relação da ação educativa com a ação evangelizadora.

  1. Os aspectos educativos da antropologia cristã

Partir da educação não significa seguir a deriva antropológica, como numa espécie de ‘secularização’ da missão evangelizadora; nem sequer significa mover-se fora dos horizontes e dos fundamentos teologais. É possível pensar a mediação educativa no horizonte da história da salvação. A reflexão teológica pós-conciliar considerou na fé a abordagem da educação, tratando, por exemplo, do primado do Reino de Deus ou do processo de salvação no contexto da Igreja e das suas mediações pastorais; ou reconhecendo como lugares teologais as situações de vida do homem e incentivando, portanto, a lê-las com o olhar da fé.

A centralidade da pessoa na antropologia cristã possui aspetos educativos. A educação é assumida na sua acepção ampla e completa: como crescimento da pessoa e como conjunto de mediações que se colocam ao seu serviço para a tornar ciente da sua identidade, ajudá-la a abraçar o que de bom nela foi colocado pelo Criador e abri-la ao sentido e ao mistério. Focalizar a questão educativa é obrigação de todos, não só dos cristãos. A opção de pensar a educação na ação pastoral torna-se cada vez mais urgente, como confirmação da centralidade da educação como mediação privilegiada ao serviço das pessoas.

A educação ativa todas as potencialidades do jovem, das capacidades intelectuais às emotivas, até a vontade livre. Assumindo a responsabilidade pelo jovem, a proposta educativo-pastoral salesiana acompanha e educa, em sentido amplo, as suas razões de viver e, através delas, todo o seu desenvolvimento.

O ponto de partida imprescindível é o encontro com os jovens na condição em que se encontram, escutando atentamente os seus questionamentos e as suas aspirações, para valorizar o potencial de crescimento que cada um deles traz em si.

«O seu carisma (dos salesianos) coloca-os na situação privilegiada de poder valorizar o contributo da educação no campo da evangelização dos jovens. Efetivamente, sem educação não há evangelização duradoura e profunda, não há crescimento nem amadurecimento, não acontece uma mudança de mentalidade e de cultura. Os jovens nutrem desejos profundos de vida plena, de amor autêntico e de liberdade construtiva; contudo, infelizmente, muitas vezes as suas expetativas são atraiçoadas e não chegam a realizar-se. É indispensável ajudar os jovens a valorizar os recursos que têm em seu interior como dinamismo e desejo positivo; colocá-los em contato com propostas ricas de humanidade e de valores evangélicos; animá-los a inserir-se na sociedade como parte ativa mediante o trabalho, a participação e o compromisso em favor do bem comum» (Carta de Sua Santidade Bento XVI ao P. Pascual Chávez Villanueva, Reitor-Mor SDB por ocasião do Capítulo Geral XXVI).

Vista assim, a educação dos jovens não é uma manifestação opcional da caridade ou um aspeto setorial da missão; ela é o caminho a percorrer. A preocupação educativa da ação pastoral quer deixar-se alcançar pela história da vida do jovem e reconhecer que a ação de Deus passa pela nossa mediação.

Daí segue-se que são necessárias mediações culturais e pedagógicas ao serviço das pessoas; se a educação coloca a pessoa no centro, preocupando-se com a harmonia das suas diversas dimensões, as estruturas ou instituições são suas mediações, em resposta às necessidades dos jovens aos quais somos enviados (cf. Const. 26). Reconhece-se, então, a função preciosa de todas as intervenções educativas na educação da fé; elas têm a tarefa de ativar, apoiar e mediar o processo de salvação.

Nem todos os modelos educativos oferecem o precioso serviço da educação aos processos de evangelização. Apostamos de modo especial numa educação que se mede com a práxis do Reino, que é restituir vida em abundância a todos, dentro de uma perspetiva de humanização mais plena. Reconhecemo-nos numa práxis educativa que nunca se torna absoluta nem torna absolutas as estratégias, os conteúdos, os instrumentos; práxis que administra o processo educativo de maneira aberta, a partir do resultado imprevisível, não manipulável, por ter relação com o mistério da liberdade das pessoas e da ação de Deus na vida de cada um e também na das comunidades e instituições.

A educação à maturidade humana e cristã evoca mais a perspetiva pedagógica: é uma ajuda para propor o Evangelho com realismo educativo e pedagógico.

b) O Evangelho, inspiração radical

A intencionalidade da “ação educativa” distingue-se, em si mesma, da “ação evangelizadora”; cada uma delas tem a sua finalidade e os seus conteúdos caraterísticos. Devemos saber distingui-las; não para as separar, mas para as unir harmoniosamente na práxis. Ambas atuam na unidade da pessoa do jovem; são dois modos complementares de intervenção em relação aos jovens, confluem na tentativa de “gerar” o homem novo. Devem colaborar plenamente no desenvolvimento unitário, integral do jovem. A pastoral habita o terreno do humano e, ao mesmo tempo, o terreno da fé.

A evangelização dialoga com o educativo

A evangelização mede-se no terreno humano que encontra; ela assume e regenera a vida quotidiana dos jovens e a sua exigência de sentido e plenitude do que acontece no seu mundo. A evangelização, libertando todas as potencialidades educativas da mensagem de Cristo, orienta para o amadurecimento em humanidade, ilumina, propõe, questiona a liberdade. A educação, ajudando as pessoas a chegar à plenitude da vida, é fundamental para a construção da pessoa; envolve todos aqueles a quem está a peito o bem do homem. A mensagem cristã coloca-se assim na ótica educativa, oferece-se na lógica de um projeto que favoreça o crescimento verdadeiro e integral. A evangelização parece entrecruzada com as instâncias da educação, onde pode ressoar o Evangelho de Jesus Cristo como condição para ser acolhido na sua verdade.

A atenção educativa exprime-se no esforço de oferecer a proposta evangélica de modo existencialmente significativo, isto é, esforço de a calibrar, de a fazer interagir com as problemáticas da vida do jovem e, mais em geral, da busca de sentido. Como a educação é um processo e um apelo de adequação contínua ao futuro, seja do sujeito seja da cultura, deve fazer perceber o sentido da gradualidade do caminho e ajudar a programar os seus itinerários; deve saber desenvolver também uma função positiva em relação a certas modalidades de evangelização que podem pecar por ingenuidade e por abstração; deve saber estimular, na programação pastoral, uma indispensável consciência pedagógica para nunca prescindir da fundamental positividade dos valores humanos, mesmo quando feridos pelo pecado. A pastoral deixa-se interpelar pela experiência dos jovens. O reconhecimento das questões últimas que estão no seu coração, permite à fé e ao anúncio evangélico dialogar de modo fecundo com eles.

O Evangelho como inspiração radical

Por outro lado, o ponto qualificador, a sua função orientadora e a sua inspiração radical é o Evangelho: trata-se de um anúncio que questiona a vida, mais profundamente do que qualquer outro. A evangelização tem uma força que provoca. Não chega “depois”. O Evangelho entra na lógica formativa da unidade estrutural da personalidade. Os seus critérios de avaliação e operacionais referem-se a Jesus Cristo. O serviço educativo que, com inteligência, vise formação integral dos jovens não tem receio de se questionar continuamente sobre o significado e as razões da evangelização.

A ação educativa enraíza-se na de Jesus; não só a toma por modelo, mas prolonga-a no tempo. Encontra o seu significado integral e uma razão de força maior na mensagem de Jesus Cristo. Antes, encontra no Evangelho a ajuda para o amadurecimento da liberdade e da responsabilidade. O Evangelho é guia na busca de identidade e de sentido, iluminador para a formação da consciência; apresenta-se como modelo sublime para a autenticidade do amor e oferece o horizonte mais claro e empenhativo para a dimensão social da pessoa. O Evangelho inspira os critérios de avaliação, guia as opções fundamentais da vida, ilumina a conduta ética privada e pública, regula as relações interpessoais e indica a orientação do agir e do viver. A dignidade da pessoa é elevada na interação com a fé. No encontro com a Boa-Nova, a pessoa humana chega ao vértice da “imagem de Deus”, que revela à vida o seu destino transcendente, enquanto ilumina, a partir da sua luz nova, todos os direitos.

Eis a integralidade da proposta: a educação que se enriquece ao ser evangelicamente inspirada desde o início; a evangelização que desde o primeiro momento reconhece a beleza de ser oportunamente adequada à condição evolutiva dos jovens. A mediação educativa é finalmente orientada para favorecer em cada um a experiência pessoal do encontro com Deus; para orientar positivamente o processo educativo na abertura a Deus e na configuração a Cristo, homem perfeito. Esta perspetiva supera o problema, substancialmente metodológico, de como e quando anunciar o Evangelho e de como inserir todas as dimensões do Projeto Educativo-Pastoral nos ambientes pastorais concretos e nos itinerários educativos.

c) A Boa-Nova na variedade das culturas e tradições religiosas

O Projeto Educativo-Pastoral Salesiano revelou-se de grande atualidade nos mais diversos contextos. Já demonstrou a sua validade mesmo em ambientes de outras tradições religiosas, de outros contextos multiculturais e ambientes secularizados. Hoje, contudo, em sociedades extremamente pluralistas, do ponto de vista cultural e religioso, é evidente que as referências cristãs do Sistema Preventivo nem sempre podem ser exibidas explicitamente. Devem ser interpeladas e adaptadas, acentuando o seu humanismo integral, base de toda a educação, aberto à dimensão ética e religiosa que sabe atribuir a devida importância ao conhecimento e à valorização das culturas e dos valores espirituais das várias civilizações.

O que hoje se exige é conhecer bem o instrumento de que dispomos, aplicando-o nos diversos contextos em sintonia com a sensibilidade moderna. A urgência educativa convida à educação integral, que tenha em vista formar o homem todo e todo homem. A liberdade religiosa favorece o exercício das faculdades humanas criando as premissas necessárias para a realização do desenvolvimento integral, que se refere unitariamente à totalidade da pessoa em todas as suas dimensões (cf. Caritas in Veritate 11).

As obras salesianas, em força da sua vocação missionária à universalidade, são solicitadas pela presença de religiões e modalidades diversas de fé a um maior diálogo com as demais tradições espirituais e religiosas. Não se trata de renunciar à própria identidade ou ao mandato missionário, menos ainda assumir atitudes fundamentalistas. O pluralismo religioso é ocasião para maior compreensão da identidade cristã. Antes, neste sentido a consciência da própria identidade é premissa irrenunciável de qualquer diálogo sério. Devem evitar-se todas as formas de uma leitura puramente secularista, valendo o mesmo para todas as formas de rigidez diante da abertura às outras religiões. São duas atitudes que impedem o verdadeiro testemunho dos crentes na vida civil e política.

4.- A opção apostólica de campo

4.1.- Os jovens, especialmente os mais pobres, são a nossa opção determinante

a) Um amor constante e intenso pelos pobres

Dom Bosco orienta a sua obra decididamente para os jovens; escolhe conscientemente viver disponível para acolher os rapazes e os jovens “em situação de risco”; opção que se torna critério de organização da evangelização para sua libertação integral. A prioridade pelos «jovens, especialmente os mais pobres» – as palavras são de Dom Bosco – é também a nossa opção determinante (Const. 6, 26-29, 41; Reg. 1,3,11,14,15, 25,26; CG20, n. 45-57).

Dom Bosco escolhe a condição evangélica de ser pobre com os pobres. Assume para si a pobreza do Filho de Deus, também material, para caminhar na direção dos afastados. Faz da rua, das praças, dos locais de trabalho, do prado-pátio os lugares de encontro e primeiro anúncio. Acolhe os jovens sem exclusões e preconceitos, reconhecendo e valorizando o que eles trazem no coração (os seus sonhos, as suas dificuldades, os seus desafios). Caminha ao lado deles, adequando-se ao passo deles. O encontro com cada rapaz é, para ele, ocasião de diálogo e de eventual encontro com a fé. Aquele é simplesmente o terreno no qual a proposta de fé se revela como recurso de vida, potencial de plenitude de vida. Os jovens mais pobres esperam ser acolhidos, levados a sério nas suas aspirações, sentir que os seus maiores desejos encontram uma saída. A atitude de Dom Bosco é a atitude de quem acompanha; ele não substitui, não invade, não tem preconceitos, não finge confiança. Caminha realmente com eles, apoia-os, anima-os.

«Ver turbas de jovens, de 12 a 18 anos, todos eles sãos, robustos, e de vivo engenho, mas sem nada fazer, picados pelos insetos, à míngua de pão espiritual e temporal, foi algo que me horrorizou» (Memórias de Oratório, segunda década 1835-1845, n. 11).

Ele opõe à pobreza negativa dos jovens, instrumento de corrupção e causa de embrutecimento, a pobreza libertadora do Filho de Deus. Entregue à sua missão de cura das almas, está pronto a pagar o seu preço e abandonar tudo (Da mihi animas cetera tolle). Abandona-se a si mesmo e às suas próprias comodidades para viver totalmente entregue aos seus jovens, próximo dos seus rapazes, pobre com os pobres. Por isso, constrói o seu projeto de modo adequado aos jovens, sobretudo aos mais frágeis e em perigo, para ajudá-los a acolher a riqueza da vida com seus valores, prepará-los para viver com dignidade neste mundo e torná-los mais cientes do próprio destino eterno (cf. Const. 26).

Dom Bosco, sob a inspiração do Espírito Santo, teve consciência clara de ser chamado por Deus para uma missão singular em favor dos jovens pobres. Sem eles, Dom Bosco seria irreconhecível: «Por vós estudo, por vós trabalho, por vós vivo, por vós estou disposto até a dar a vida» (Const. 14). Sinais do alto, aptidões naturais, conselhos de pessoas prudentes, discernimento pessoal, circunstâncias que se sucediam providencialmente, convenceram-no de que Deus, ao enriquecê-lo com dons especiais, pedia-lhe uma dedicação total aos jovens.

«Prometi a Deus que até o meu último alento seria para os meus pobres jovens» (Const. 1).

Na atual urgência da Nova Evangelização, deve recomendar-se o mesmo espírito missionário da ação pastoral de Dom Bosco: espírito missionário que leve onde as necessidades e os desafios dos jovens ainda não são preocupação.

b) A pobreza compromete as reservas educativas e o crescimento dos jovens

A opção salesiana pelos jovens em maior perigo oferece-nos um modo de olhar e de interpretar a realidade: o ponto de vista dos jovens. Somos, pois, sensíveis às condições que favorecem a sua educação e evangelização, como também àquelas que trazem riscos. Estamos atentos aos aspetos positivos, aos novos valores e às possibilidades de recuperação. Todas as formas de pobreza bloqueiam ou chegam a destruir os recursos educativos da pessoa e comprometem o crescimento dos jovens como filhos de Deus. Todo o jovem traz dentro de si os sinais do amor de Deus no desejo de vida, na inteligência e no coração. Aos crentes pede-se que tomem a peito todas estas expressões de pobreza, novas e antigas, e inventem novas formas de atenção, solidariedade e partilha para as curar.

«É hora de uma nova fantasia da caridade» (Novo Millennio Ineunte 50).

Evangelizar e educar nestes contextos significa acolher, dar novamente a palavra, ajudar a reencontrar-se a si mesmo, acompanhar com paciência ao longo do caminho de recuperação de valores e de confiança. Esta opção determinante é parte essencial da espiritualidade salesiana, que professa a força redentora da caridade pastoral e proclama o desejo e a determinação de “salvar” aqueles que vivem abandonados por todos. É um amor que se exprime com respostas ágeis e imediatas diante da inquietação juvenil, amor que se empenha em dar vida e esperança. A missão original da Igreja e da Congregação é o núcleo do anúncio de Cristo (cf. Evangelii Nuntiandi 32).

«Temos uma preocupação particular pelos jovens, porque eles, que são parte relevante do presente da humanidade e da Igreja, são também o seu futuro […]. Queremos apoiá-los na sua busca e encorajamos as nossas comunidades a entrar sem reservas numa perspetiva de escuta, de diálogo e de proposta corajosa em relação à difícil condição dos jovens. Para resgatar, e não mortificar, o poder dos seus entusiasmos. E para apoiar em seu favor a justa batalha contra os lugares comuns e as especulações interesseiras dos poderes mundanos, interessados em dissipar as energias e em consumir os seus impulsos em seu benefício, privando-os de qualquer memória grata do passado e de qualquer projeto sério de futuro. A nova evangelização tem no mundo dos jovens um campo empenhativo, mas também particularmente promissor […]. Deve-se reconhecer aos jovens um papel ativo na obra de evangelização, sobretudo em relação ao seu mundo» (Sínodo dos Bispos (2012),Mensagem ao Povo de Deus 9)

O anúncio da salvação aos pobres, sinal por excelência do Reino de Cristo, é a componente mais profunda da nossa missão educativo-pastoral. A relação com Jesus Cristo e o seu Evangelho é um dom a oferecer a todos, uma fonte que satisfaz a sede e a busca de sentido: se Cristo se entrega aos mais pobres e necessitados, não podemos retardar o dom do encontro com Ele.

A opção preferencial pelos jovens, sobretudo pelos mais pobres, leva-nos aos ambientes populares em que eles vivem (cf. Const. 29). Nos ambientes populares, somos chamados a levar o espírito de família e de compreensão com o contacto quotidiano da nossa ação apostólica.

4.2.- A humanização e a evangelização da cultura

a) Fidelidade ao Evangelho e fidelidade à cultura

«Para a Igreja não se trata tanto de pregar o Evangelho a espaços geográficos cada vez mais vastos ou populações maiores em dimensões de massa, mas de chegar a atingir e como que a modificar pela força do Evangelho os critérios de julgar, os valores que contam, os centros de interesse, as linhas de pensamento, as fontes inspiradoras e os modelos de vida da humanidade, que se apresentam em contraste com a Palavra de Deus e com o desígnio da salvação» (Evangelii Nuntiandi 19).

O fim próprio da educação e da verdadeira atividade cultural é libertar o jovem, torná-lo ciente dos seus próprios direitos e deveres, participante consciente nos acontecimentos da sua época, capaz de autodeterminação e colaboração por uma sociedade mais humana. Educar desta forma produz cultura, abre-a e enriquece-a. Este processo torna-se realidade, não só instilando na sociedade ideias novas, impulsos novos e seiva nova, mas principalmente preparando pessoas corajosas, portadoras de reflexão crítica e de sadia conduta de vida.

«A palavra “cultura” indica, em geral, todas as coisas por meio das quais o homem apura e desenvolve as múltiplas capacidades do seu espírito e do seu corpo; procura dominar, pelo estudo e pelo trabalho, o próprio mundo; torna mais humana, com o progresso dos costumes e das instituições, a vida social, quer na família quer na comunidade civil; e, finalmente, no decorrer do tempo, exprime, comunica aos outros e conserva nas suas obras, para que sejam de proveito a muitos e até à humanidade inteira, as suas grandes experiências espirituais e as suas aspirações» (Gaudium et Spes 53).

A evangelização não é apenas conformidade com os valores do Evangelho, transmitidos pelo Fundador; é também encontro com a cultura. O indispensável empenho cultural comporta o encontro com as novas questões de vida geradas pela cultura, questões que põem à prova o realismo da nossa proposta cristã e confirmam a nossa capacidade de diálogo. É preciso, por isso, um conhecimento adequado da complexa realidade cultural e sociopolítica. É necessário um exercício de “discernimento”, reformulando a experiência cristã em relação com as situações históricas concretas em que ela é chamada a realizar-se. Na verdade, a evangelização das culturas representa a forma mais profunda e completa de evangelização de uma sociedade.

O mundo juvenil é o “lugar” por excelência no qual, de forma mais imediata, se manifestam os traços culturais típicos da nossa sociedade. Aqui exige-se um discernimento atento e a capacidade de perceber em profundidade os problemas postos pelas mudanças em curso. É urgente entender a sua realidade cultural, com o seu conjunto de valores e limites, experiências, linguagens e símbolos. São estes os elementos que formam a sua mentalidade e a sua sensibilidade. Os desafios não são um obstáculo problemático, mas uma provocação positiva que nos interpela e solicita uma corajosa intervenção. A ação realizada pela Congregação em relação à cultura, como foi dito, complexa e articulada, já não pode ser compreendida no interior de um universo cultural homogéneo, mas num horizonte determinado pela pluralidade de situações. Com efeito, numerosos fatores concorrem para desenhar um panorama cultural cada vez mais fragmentado e em contínua e rapidíssima evolução. Enunciamos alguns deles:

  • as diferentes situações de pobreza e exclusão social: cada vez com mais frequência fragilidade e marginalidade desembocam em fenómenos de dependência de drogas, de desvios, de violência;
  • a situação e a compreensão da família, com as consequentes problemáticas humanas e éticas;
  • as questões relativas à vida e à sua capacidade de transmissão de valores;
  • a esfera afetiva e emotiva, o âmbito dos sentimentos, como a corporeidade, são fortemente marcados pela tempérie cultural;
  • os sistemas educativos e a qualidade e integralidade da formação que oferecem;
  • a cultura digital que favorece e, por vezes, provoca contínuas e rápidas mudanças de mentalidade, de costumes e de comportamentos;
  • um dos horizontes mais complexos e fascinantes das sociedades atuais: a identidade multicultural e multirreligiosa dos povos;
  • os pressupostos antropológicos que sustentam interpretações sociológicas e educativas;
  • as correntes de pensamento que insistem na negação da transcendência, no desconhecimento da estrutura relacional do homem e da relação baseada em Deus.

b) Os desafios da cultura atravessam todas as experiências pastorais

A atenção prioritária atravessa todas as experiências pastorais que se revelam como desafios para todos: para o crente e o não crente, para quem pertence à Igreja e para quem pertence, para o jovem e o adulto. São os desafios inscritos no interior da própria vida, na sua pobreza e na sua riqueza, na sua dignidade, nos seus dons e nos seus apelos, que a todos se impõem e para todos são promessa.

O educador salesiano confronta-se seriamente com esta cultura, descobre nela os sinais da presença de Deus e os apelos à renovação da pastoral, da linguagem e das atitudes. Nesta ótica, a evangelização torna-se sensível à instância do diálogo. Torna-se prioritária a solicitude positiva pelos valores e as instituições culturais, como também pelas ciências antropológicas que têm o próprio contributo específico a oferecer. O confronto é enriquecedor, porque tem a capacidade de levar à unidade o contributo específico de cada disciplina. Trata-se de um vasto horizonte que se deve conhecer, habitado por importantes valores e, em parte, por anti-valores. No seu conjunto, tudo incide profundamente no modo de pensar e de agir, como também na maneira de viver das pessoas, famílias e instituições sociais.

Como Dom Bosco, manifestamos interesse especial pelo mundo o trabalho (cf. Const. 27). Ele preocupou-se também com dotar as jovens gerações de adequada competência profissional e técnica. Notável a sua preocupação para favorecer uma cada vez mais incisiva educação à responsabilidade social, tendo por base a consciência da dignidade pessoal: uma educação para o social ao qual a fé cristã não só confere legitimidade, como também confere energias incalculáveis. Mediante o trabalho e o uso correto dos recursos, o “honesto cidadão” não só se realiza como pessoa, mas também contribui para o bem comum, dando um contributo substancial em benefício da sociedade: um projeto que tem as suas raízes na visão evangélica do homem empenhado no bem de todos.

Os nossos ambientes educativos são chamados a ser centros de irradiação da cultura da vida para as famílias, para os vários grupos, para o território e para a sociedade. A Nova Evangelização exprimirá a sua novidade no renovado ardor do testemunho da caridade, na proposta de novos métodos de um alegre anúncio de Cristo e nas convictas expressões de diálogo inteligente com a cultura, visando os jovens e todos os que, de modos variados, esperam o bom anúncio – euanghèlion (cf. Const. 30).

«Recebemos um sinal, isto é, que nas vésperas do novo milénio — nestes novos tempos, nestas novas condições de vida — volta a ser anunciado o Evangelho. Teve início uma nova evangelização, quase como se se tratasse de um segundo anúncio, embora na realidade seja sempre o mesmo» (João Paulo II, Homilia durante a missa no Santuário de S. Cruz, Mogila (Polónia), 9 de junho de 1979).

«Através da Igreja, o Senhor Jesus chama-nos a realizar uma nova evangelização: “nova no seu ardor, nos seus métodos e nas suas expressões”»(João Paulo II, Discurso à XIX Assembleia do CELAM, 9 de março de 1983).

«Na realidade, o apelo à nova evangelização é, antes de tudo, um apelo à conversão. De facto, através do testemunho de uma Igreja cada vez mais fiel à sua identidade e mais viva em todas as suas manifestações, os homens e os povos de todo o mundo poderão continuar a encontrar Jesus Cristo» (João Paulo II, Discurso à IV Assembleia do CELAM, 12 de outubro de 1992).

Fonte: A Pastoral Juvenil SalesianaQuadro de Referência

Leave a Comment

O seu endereço de email não será publicado.